06 novembro, 2009

FEMALE PRISONER #701 SCORPION



Gênero: Women in Prison
Ano: 1972
Com: Kaji Meiko, Yokoyama Rie, Isao Natsuyagi, Fumio Watanabe, Yayoi Watanabe, Yoko Mihara 

Direção: Ito Shunya 

Argumento: A jovem Matsushima Nami é presa após o homem por quem se apaixonou - um policial de narcóticos - usá-la como isca para prender traficantes e acusá-los de estupro. No julgamento, Matsu não testemunha contra seu ex e o empresário com quem ele tem acordos escusos. Sabendo das inúmeras confusões que ela arranja na prisão e temendo por sua fuga, o policial contrata outra detenta - Katagiri - para acabar de vez com Matsu.

Plano geral: O filme é a estreia na direção de Ito Shunya, que dirige também as duas continuações imediatas da quadrilogia original. Female Prisoner 701 Scorpion é uma série com nove filmes, o último de 1998, e talvez um dos mais conhecidos exemplares no Ocidente dos pinku eiga da Toho. Este gênero de filme - "filme cor-de-rosa", também conhecido como pink violence - é um marco no cinema japonês contemporâneo. Neles, as mulheres são alçadas à condição de heroínas e vilãs, retirando-as de sua tradicional função periférica nos filmes de ação e aventura, até então ainda presos ao drama histórico, calcado no Kabuki. É passo essencial para obras modernas como Machine Girl e Yo Yo Girl Cop.

Direção: O debut de Shunya é em grande estilo. Logo na primeira cena, contemplamos a formatura de oficiais. O alarme soa, anunciando que alguém fugiu da prisão, o que faz com que os policiais partam em disparada. Entre os pés dos policiais correndo, o regulamento da Polícia é pisoteado por todos. Que maneira melhor para sabermos que estes policiais, afinal, não seguirão nenhum princípio de direitos humanos?

Luzes: Talvez tenha sido o que mais me encantou em Female Prisoner 701 Scorpion: o uso que Shunya faz das cores e luzes, transformando em poesia um filme que outro faria banal. Na esteira de diretores como Suzuki Seijun (Branded to Kill), Ito usa as cores para indicar as emoções e ações de alguns personagens: raiva (vermelho), vingança (verde), loucura (azul). A cena em azul é a mais interessante: após ser traída e ferida por Matsu, outra garota enfurece-se ao ponto de tornar-se um 'yokai', um demônio japonês: ela aparece maquiada e pintada como estes demônios da cultura japonesa. Os sons se transformam em ruídos assustadores e um plano com grande profundidade de campo - um corredor de detentas, com o diretor do presídio ao fundo - remete Matsu às suas duas alternativas: ou prosseguir na prisão, ou morrer nas mãos de um demônio. Belíssimo.

Palco: Outra experimentação de Shunya é a junção de duas ou mais cenas no mesmo cenário. A cena em que Matsu é estuprada - que já é belíssima por contar com piso transparente e filmar ação de baixo - troca o fundo com um giro de palco: o policial corrupto gira a parede para se encontrar com seu chefe, em primeiro plano, enquanto Matsu continua no chão, chorando. Outra cena impressionante é a em que o casal transa: o policial desenrola - literalmente - Matsu do lençol, que gira pelo chão enquanto vai se desnudando.

Tortura: Gênero é gênero. E a cartilha do filme W.I.P. reza que deva existir cenas de torturas, sexo lésbico e banho coletivo. Obviamente, aqui tem tudo disso. Enquanto é torturada, Matsu apenas sorri, raramente se queixando de dores. Ela é queimada com sopa, com uma lâmpada, obrigada a trabalhar até a exaustão e torturada coletivamente. Quanto ao sexo, a cena é bem bacana e não é explícita quanto outros filmes do gênero. O último plano da cena coloca Kitoh, nua, aos pés de Matsu implorando por mais toques da heroína. Se torna uma boa metáfora da posição de Matsu dentro da prisão em relação aos policiais, pois, na verdade, Kitoh é agente infiltrada.
Depois de tudo: Female Prisoner 701 Scorpion é o primeiro "Gatas atrás das grades" (W.I.P., de Women in Prison) sério que vejo. A própria aparência da prisão e das detentas aponta isso: não são mulheres de aparência grotesca, que transformam assistir ao filme em martírio, tampouco são modelos impecáveis que denunciam por sua falsidade. A prisão é suja e velha e as mulheres são normais, raramente lindas, muitas vezes comuns e estúpidas. Junto a esse ponto de realismo, a poética visual de Shunya é impressionante. Enquanto todas as cenas características do gênero estão lá, como estupro, violência, policial sádico, etc., o enredo não perde o foco: Female Prisoner 701 é sobre VINGANÇA. Não é a toa que a atriz que interpreta Matsu, Kaji Meiko, também cantora, interprete duas músicas na trilha sonora de Kill Bill, incluindo o tema deste filme, "Urami Bushi" ('Música da vingança'). Porém, Matsu só se transforma neste anjo vingador no final, limitando o resto do filme à promessa de vingança. A espera, é claro, vem acompanhada de estupros coletivos, lutas de meninas, sado-masoquismo e por aí vai...